Tema 4 – A ABPN e a Articulação Internacional[1]
Andréia Lisboa de Sousa[2]
Todos “os seres, vivos ou mortos, se inter-relacionam e
influenciam. Há ações de forças que tendem a diminuir a energia vital e outras que a aumentam, fazendo interagir harmonicamente todas as forças que
Nzambi criou e colocou à
disposição [da mulher e] do homem.”[3]
Introdução
Laroiê, Exu! Saudações de Ngunzo e Axé (energia vital) vindas de nossas grandes mães ancestrais e criadoras do mundo à tod@s!
Prezad@s associad@s, a cada texto e trocas neste seminário virtual desvendamos o quão árdua é a luta em prol de se pensar os desígnios de uma agenda de pesquisa antissexista e antirracista. Os desafios são inúmeros, o trabalho é incomensurável, o nosso tempo nesse paradigma capitalista devorador e genocida rouba a nossa dignidade negra. Não é fácil conjugar nossa vida individual com a vida ativista e a vida acadêmica, mantendo sempre viva a conexão com noss@s ancestrais. O trabalho, o chamado e as demandas são enormes e por isso nossos esforços terão quer ser comunitariamente multiplicados ou triplicados para continuarmos os avanços que a ABPN conquistou nesses dois últimos anos.
O propósito deste texto é proporcionar alguns subsídios para reflertimos coletivamente sobre a construção e/ou fortalecimento da articulação internacional para a ABPN. Inicialmente, me deterei em alguns conceitos básicos sobre o termo ‘cooperação internacional’ para podermos dialogar sobre as possibilidades de articulação em âmbito supra-nacional para a ABPN que podemos vislumbrar. Posteriormente, esboçarei algumas potenciais fontes de cooperação nas quais poderemos criar uma rede interna e externa estratégica para estabelecer uma produção de conhecimento para e por pesquisador@ s negr@s no âmbito internacional. Por último, apresento minhas considerações, enfatizando a necessidade de impulsionarmos uma rede de articulação internacional solidária, consistente e transformadora.
Antes porém, como exercício político do nosso estar na academia, há que se perguntar: o que a crescente presença negra no regime de produção de conhecimento pode trazer de novo para a política transnacional negra? Faço esta pergunta para que contextualizemos a reflexão neste bloco do Seminário virtual da ABPN, levando em consideração as discussões que tem sido feitas no âmbito da academia branca sobre um suposto imperialismo cultural advindo dos Estados Unidos. É conhecida entre nós a polêmica em torno do artigo de Pierre Burdieu e Wacquant (1999) sobre as “artimanhas da razão imperialista” , na qual os autores acusavam os pesquisadores negros do Brasil e dos EUA de criarem uma suposta importação dos problemas do norte para a realidade brasileira. Como pano de fundo estava não a preocupação com o imperialismo norte americano – como está evidente nos discursos de autores como Demetrio Magnoli, Marcia Green e Peter Fry – mas a preocupação com a crescente e vibrante cooperação entre intelectuais negr@s dos dois países. O medo, portanto, tem endereço e razões político-econô mico-acadê micas profundas.
Articulação Institucional: Cooperações formais e informais
De modo geral, definiria aqui cooperação no contexto da diáspora africana como uma forma de colaboração, trabalho conjunto ou suporte para a realização de um projeto/programa ou proposta em comum, visando desenvolver ou aprimorar o ensino, a pesquisa, a extensão universitária e a produção de saberes negr@s para a promoção da equidade no campo do conhecimento acadêmico-profission al. Igualmente, o conceito de cooperação expressa e diáloga de forma ampla todas as estratégias, arcabouços e acúmulos históricos de negras e negros na luta pela igualdade. Necessitamos resgatar parte dessas estratégias para pensarmos a articulação institucional da ABPN.
Por último, a articulação internacional negra tem a ver com a política de privilégios acadêmicos, econômicos e culturais que o estado brasileiro tem mantido ao longo dos anos em suas parcerias, convênios, tratados, acordos etc. As parcerias internacionais que o estado brasileiro tem realizado, salvo exceções, têm beneficiado as estruturas de poder e impedido a realização de relações mais horizontalizadas de modo a beneficiar a/o produção de conhecimento que vem sendo desenvolvida por negr@s brasileiros desde as formas de sobrevivência à escravidão e antes da colonização moderna.
Ainda assim, @s negr@s têm historicamente criado vias informais e formais de cooperação, negociação e estabelecimento do que concebemos como ”parcerias” hoje entre os diversos grupos étnicos africanos desde o processo de escravidão para obter liberdade.
Atualmente o termo que se utiliza para qualquer tipo de articulação institucional é cooperação ao invés e colaboração. Esta última refere-se mais ao estabelecimento de relações assimétricas, em que há uma figura central, principal, que controla e intervém na ação/programa, sendo que @s demais envolvidos agem como peça secundária. Já a cooperação em tese deve tratar cada perceir@ de forma mais balanceada, complementar, propiciando independência e confiança mútua para as partes envolvidas.
A cooperação internacional pode ser de natureza bilateral (entre dois países parceiros), multilateral (entre um país e uma instuição internacional) ou trilateral (essa é mais complexa e pode envolver tanto dois países denominados como em “desenvolvimento” com país investidor/doador quanto dois países investidores com um em desenvolvimento) . Ainda existe a cooperação governamental, também conhecida como cooperação oficial e os acordos diretos de cooperação entre instituições. Ainda do ponto de vista formal, existem a cooperação técnica que diz respeito ao intercâmbio externo entre países sem fins lucrativos ou comerciais e a cooperação financeira reembolsável ou não.
Quando nos deparamos com o histórico e a forma como ocorrem as cooperações internacionais no Brasil relacionadas a projetos para a comunidade negra, não será difícil constatar que @s estudiosos, planejadores e administrador@ s desse tipo de projeto são majoritariamente professor@s universitári@ s brancos. O padrão paternalista e o privilégio branco em geral se repete quando professor@s negr@s são convidados meramente para serem pareceristas e não gestores internacionais de projetos. A ABPN pode e deve dar um salto a respeito disso. Temos que ter negr@s não apenas como bolsistas ou alvo de capacitação, mas também como os gestores de recursos, da política de intercâmbios, enfim do processo como um todo. Esse padrão colonial tem que ser desbancado e a ABPN pode cumprir papel estratégico aqui.
Os institutos tradicionais de fomento à pesquisa como CNPq, CAPES, FAPESP, e as fundações internacionais como Fundação Ford (EUA), Fundação Carolina (Espanha), Fulbright (EUA) entre outras, são majoritariamente comandadas por brancos que, com raras exceções, reproduzem o padrão do encontro colonial. Não raro, os projetos e ambições acadêmicas negras são descartados ou desqualificados como não científicos por carecerem de uma suposta objetividade- racionalidade que nós negras e negros não temos.
Neste sentido, vale ressaltar que para a academia racista branca brasileira ter negr@s como pensadores, cientistas, gestores de projetos etc é algo ainda que teremos que estrategicamente conquistar. Por isso, muitas articulações internacionais têm ficado no plano ainda informal. Ainda assim, a agenda acadêmica negra cresce e com ela um novo padrão de produção de conhecimento. Por exemplo, várias ONG’s de mulheres negras desde o fim da década de 80 obtiveram parcerias de organizações estadunidenses e pesquisador@ s negr@s durante a década de 90. Foram realizadas cooperações informais, principalmente com organizações estadunidenses, para conseguir bolsas, cursos, intercâmbios para língua estrangeira, visitas, seminários, cursos rápidos de capacitação, publicações etc.
A verdade é que a formação de uma rede transnacional negra tem se dado à revelia das iniciativas oficiais de apoio como historicamente tem recebido @s branc@s. É o movimento subterrâneo afrodiaspórico em ação. Um exemplo concreto deste movimento foi a graduação de estudantes da instituição Stive Biko (Sa/BA) recentemente aqui nos EUA. Uma parceria entre a Biko, em Salvador, e uma organização negra, Morehouse College, dos EUA possibilitou o intercambio cultural e político de jovens negros sem necessariamente criar um convênio ou algo similar. Outra experiência histórica que começou informalmente e, após alguns anos, se tornou um projeto oficial é a parceria entre a organização de mulheres negras de Criola (RJ) e o centro de estudos africanos e afroamericanos da Universidade do Texas. O centro tem dado suporte para que mulheres negras de Criola possam cursar a pós-graduação lá. Uma terceira significante experiência foi a articulação da ACMUN - Associação Cultural de Mulheres Negras, Porto Alegre/RS para desenvolver um projeto comunitário na área de saúde - Lai Lai Apejo, em parceria com a Criola e o Spelman college - colégio histórico para mulheres negras norte-americano.
Experiências como essas têm acontecido em várias partes do Brasil com instituições negras, principalmente de mulheres negras.
Acredito que podemos também aprender, investir, desenhar novas cooperações a partir das experiências e capital cultural internacional que organizações de mulheres negras e outras entidades negras, bem como professor@s negr@s têm acumulado ao longo dos anos. E para dar vazão à demanda e à necessidade histórica, a ABPN já pode considerar que têm contatos estratégicos, por meio de esforços individuais de algumas/ns professor@s universitári@ s negr@s na Jamaica, Estados Unidos, Portugal, França, Alemanha, vários países africanos (África do Sul, Nigéria, Moçambique, Senegal, Benin, Ghana, Angola, São Tomé, Cabo Verde) etc.
Quais as vantagens de uma cooperação internacional? Por que estabelecer cooperações internacionais? Entendo que a cooperação internacional pensada estrategicamente é valida e deve favorecer a inclusão negra na área de ensino, pesquisa, desenvolvimento científico e tecnológico bem como certamente no mercado de trabalho. Mais do que válida, ela é necessária para fortalecer laços politico-acadê micos numa perspectiva afrodiaspórica que vise a luta por uma academia democrática, com uma visão crítica das relações de poder e suas implicações nas relações raciais, de gênero e econômicas.
Um exemplo concreto das artimanhas institucionais do privilégio branco na academia brasileira pode ser ilustrado com a Universidade do Texas em Austin, cujo centro de estudos brasileiros (Brazil Center) administra os convênios selados com o Brasil. Certa vez um grupo de pesquisador@ s ativistas afrobrasieir@ s questionou formalmente o fato de o governo brasileiro ter exclusivamente promovido bolsas internacionais para estudantes brancos. A resposta da coordenadora do centro foi que a competência do Centro é apenas administrar os convênios e que o Brasil é quem decide os beneficiados. Na época organizamos um quadro sobre o número de estudantes negr@s na Universidade do Texas. Entre os dez estudantes afrobrasiler@ s, com exceção de uma aluna visitante com bolsa somente para seis meses, nenhum havia sido financiado pela CAPES ou CNPQ. O que essa pequena amostra tem revelado sobre a política internacional de bolsas das agências brasileiras?
Enfim, necessitamos de uma perspectiva de cooperação crítica, transformadora e promotora de uma comunidade científica negra (negrejada) qualificada, diversa e que vá além de projetos individuais que cada uma/um tem, mas sobretudo comprometida com um projeto coletivo de acesso, permanência, sucesso e inserção acadêmica negra.
Rede Estratégica de Articulação Internacional
Diante da experiência que tenho vivenciado estudando e representando a ABPN fora do país, gostaria de apresentar algumas sugestões, que poderão contribuir para o avanço da ABPN:
a) articular com a CAPES e CNPQ a disponibilidade de bolsas de pós para negr@s em universidades no exterior. A maioria de estudantes financiados por essas agências é branca e da área de ciências tecnológicas. @s negr@s estão excluíd@s das oportunidades de acessar, elaborar, partilhar e produzir conhecimento acadêmico em nível internacional;
b) mapear os programas e acordos já existentes entre essas agências com diversas universidades nos diversos continentes (africano, europeu, Américas e Caribe etc) e estabelecer um plano estratégico de bolsas para negr@s, prevendo curso pré-acadêmico para lingua estrangeira, quando necessário;
c) mapear universidades latinoamericanas, africanas, norte-americanas e européias com interesse em receber estudantes brasileir@s e negociar o ingresso de estudantes (via agências brasileiras, via ABPN e via os próprios programas de potenciais universidades) em nível de graduação e pós-graduação principalmente nas áreas sub-representadas como as ciências médicas e tecnológicas;
d) Publicação de números especiais da Revista da ABPN sobre temas tais como: i) África; ii) diáspora Africana na Asia, Europa, Américas; iii) Circulação e Produção de conhecimento científico na diáspora, traduzido para o Inglês, Francês e Espanhol, visando o diálogo com os pares e também contatos estratégicos;
e) Conhecer e incluir negr@s nos programas que a SESu já tem com universidades estrangeiras como também acompanhar mais de perto os critérios de seleção e divulgar as oportunidades criadas pelas agências internacionais e o MEC-ProUni;
f) Envidar esforços entre ABPN e NEABs (por meio de moção/diálogo/pressã o/abaixo- assinado) para que a Universidade da América Latina criada no Paraná, tenha um departamento sobre Estudos Diaspóricos na América Latina. Essa é uma ação que deve ser priorizada agora e já e a meu ver deveria ser protagonizada pelo CONEABs (Consórcio dos Núcleos de Estudos Afrobrasileiros) ;
g) Criar projetos para financiar a tradução de obras estrangeiras relevantes para o contexto brasileiro e vice-versa;
h) Uma área que também mereceria atenção seria a arqueologia. O Brasil tem muitos sítios que poderiam trazer novas informações sobre a história e organização negra, a partir de estudos arqueológicos. Os USA tem um número irrisório de arqueológos negr@s (nao passa de 10) e há essa possiblidade de se negociar o treinamento de arqueológos brasileiros nos Estados Unidos. Cabe a ABPN saber se há interesse e fazer um levantamento de pesquisad@r na área;
i) O que temos de mais concreto em termos de articulação internacional é o pano de cooperação Brasil/Estados Unidos que tem sido coordenado pela Seppir. A ABPN já participou de três encontros para a construção do Plano de Ação. Sendo que no último, 20 e 21/05 passado em Atlanta/EUA, estive presente para trabalhar com Raquel Luciana de Souza (Gerente de Projetos da ABPN) e a professora e presidente da ABPN Eliane Cavalleiro. Conseguimos ter aprovada, no GT de Educação e combate ao racismo institucional, a proposta de financiamento para pesquisas em parceria com universidades estadunidenes. Nessa missão, Raquel, teve a oportunidade de visitar diversas instituições, tais como: Universidade Internacional da Florida, Universidade Samford, Instituto de Direitos Civis de Birmingham (BCRI), onde surgiram possibilidades concretas de parcerias institucionais com a ABPN.
j) no âmbito da política empresarial de responsabilidade social, elaborar projetos para empresas públicas e privadas, na perspectiva de propiciar bolsas de estudos para cursos de línguas, fundamental para o desenvolvimento acadêmico-profission al.
* Ter pesquisador@ s proficientes em inglês, francês, espanhol etc seria fundamental para podermos circular a produção, ampliando assim as trocas de conhecimentos diaspóricas, que em muitas situações ficam restritas a algumas/uns professor@s universitári@ s que dominam essas línguas e têm contatos internacionais;
* vale ressaltar a necessidade de priorizar a juventude nos intercâmbios de aprendizado de línguas estrangeiras, a fim de prepararmos futur@s professor@s universitári@ s, pesquiador@s e gestor@s do ensino superior;
l) ABPN deve organizar workshops informativos e formativos sobre intercâmbios e outras articulações internacionais em nível global; oferecer conhecimento técnico, por meio de workshops para a elaboração de projetos, que podem ser realizados na plataforma online, em parceria com os Neabs e professor@s universitári@ s;
m) conhecer a estrutura e estratégias utilizadas para a solidificação de centros afros em universidades estrangeiras, principalmente, os históricos black colleges e a experiência da faculdade para mulheres (Spelman College) nos Estados Unidos. Observar que lições podem ser tiradas para pensar a realidade brasileira;
n) Criar uma rede solidária de contatos efetivos. Professsores universitári@ s e organizações negr@s têm participado de fóruns/eventos internacionais e identificado potenciais parceiros. Há uma necessidade de capitalizarmos e socializarmos com a ABPN os possíveis contatos para parcerias internacionais nas diversas instâncias;
Articulações Internacionais[4]
Suporte financeiro | Fonte | Informação geral |
Programa de Apoio a Eventos no Exterior (PAEX)
| http://www.capes. gov.br/bolsas/ bolsas-no- exterior/ paex
| Apoiar a apresentação de trabalhos científicos de professores e pesquisadores, portadores de diploma de doutorado, em eventos no exterior, propiciando visibilidade internacional da produção científica, tecnológica e cultural brasileira. |
Estágio de Doutorando - PDEE (sanduíche/sandwich) | http://www.capes. gov.br/bolsas/ bolsas-no- exterior/ estagio-de- doutorando- pdee | estabelecimento e/ou a manutenção do intercâmbio dos cursos de pós-graduação do país com seus congêneres no exteri or, por intermédio da concessão de co- tas de bolsas às Instituições de Ensino Superior para estágio de doutorando no exterior. |
Professor visitante | colaboração com grupos de pesquisa emergentes ou consolidados, para o desenvolvimento de linhas de pesquisa ou desenvolvimento tecnológico consideradas relevantes | |
Brown University Summer Research Institutes (BIARI)/USA | BIARI visa o desenvolvimento de uma plataforma acadêmica para professor universitário jovem do eixo Sul.
| |
British Council (Londres) | Trabalha com relações entre pesquisadores recentes e cientistas no mundo; contato com instituições de pesquisa e laboratórios em nível superior
| |
Research Project Grants (RGC) | http://www.ugc. edu.hk/eng/ rgc/grf/applicat ion/application. htm | O RGC fundos para as áreas de: engenharia, física, biologia, medicina e humanidades, ciência sociais e business.
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Guia europeu - líderes em projetos | Método para se preparar projetos na Europa (20 págs) | |
Agencia Española de Cooperación Internacional para el Desarrollo (AECID) | Bolsas, cursos acadêmicos e de verão, parcerias com ONG’s etc | |
A Agência Brasileira de Cooperação (ABC), que integra a estrutura do Ministério das Relações Exteriores (MRE)
| http://www.ensp. fiocruz.br/ portal-ensp/ cooperacao- internacional/ cooperacao- tecnica/
| ABC é formada por sete coordenações: CGPD - Coordenação Geral de Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento; CGRB - Coordenação Geral de Cooperação Técnica Recebida Bilateral CGRM - Coordenação Geral de Cooperação Técnica Recebida Multilateral CGMA - Coordenação-Geral de Cooperação em Agropecuária, Energia, Biocombustíveis e Meio-Ambiente CGTI - Coordenação-Geral de Cooperação em Tecnologia da Informação, Governança Eletrônica, Defesa Civil, Urbanismo e Transporte CGDS - Coordenação-Geral de Cooperação em Saúde, Desenvolvimento Social, Educação e Formação Profissional CGAP - Coordenação Geral de Acompanhamento de Projetos e de Planejamento Administrativo Cooperação Horizontal/Sul- Sul CGPD - Coordenação Geral de Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento
|
Considerações
A conjuntura política brasileira durante o atual governo tem sido um tanto quanto favorável, uma vez que na história do Brasil diversos acordos/convê nios e parcerias com países africanos têm sido criados, haja a vista a Universidade Afro-Brasileira, por exemplo. Temos necessidade de construir uma cooperação internacional para a ABPN, a fim de favorecer a pesquisa, o ensino, a profissionalizaçã o e a autonomia da entidade com poder decisório sobre qualquer tipo de acordo/cooperaçõ es internacionais a serem realizadas.
É fundamental estabelecer uma rede de articulação internacional solidária, consistente e transformadora que rompa com o padrão de produção de conhecimento de “uma via mão única” que vem sendo criado, consolidado e determinado os padrões/modelos de convênios, parcerias ou redes no Brasil que excluem @s negr@s das posições de poder e gerenciamento. Temos sim que criar uma rede diaspórica que some nosso capital de luta e agenda de pesquisa para promover novas formas de pensar e fazer pesquisa numa perspectiva libertadora, antissexista, antirracista, anti-heteronormativ a e anti-elitista.
Para isso é essencial termos pesquisador@ s, professores e profissionais comprometidos em interagir numa articulação ou projeto internacional que: a) beneficie e mantenha a perspectiva da coletividade negra; b) que dialogue por um lado com a produção afrodiaspórica democrática e libertadoras; c) que por outro lado questione a imposição de um padrão de produção de conhecimento, conceitos e pesquisas dos países do bloco norte em relação aos do bloco sul; d) a ABPN deve elaborar estudos sobre o impacto (ou o não impacto) dos projeto de cooperação internacional na vida da população negra e divulgá-los largamente para a sociedade brasileira. Por exemplo, até que ponto nos acordo entre o Brasil e UNESCO, BID, Unicef, dentre outras instituições, para produzir estudos, pesquisas e desenvolvimento educacional fica explicitado por estes organismos internacionais a necessidade e prioridade em tratar interseccionalmente as categorias de gênero, raça e classe nos projetos/programas?
Outro aspecto importante para o desenvolvimento e sucesso de qualquer ação/projeto/iniciati va é não perder de vista esse princípio de interseccionalidade de gênero, raça e classe. Igualmente, obedecer o princípio da representação regional e o protagonismo juvenil. Com exceção da Bahia, o norte o nordeste do Brasil continua carecendo de atenção e parcerias estratégicas. A juventude negra brasileira está na academia e tem estabelecido uma articulação estratégica com jovens da América Latina e Caribe. A ABPN não deve perder de vista o potencial e trabalho d@s @s jovens. Mais ainda, a ABPN deve pensar num projeto estratégico de parceria internacional para investir n@s futur@s jovens pesquisador@ s, doutores, ministros, gestores nas diversas áreas do conhecimento, do ensino, da pesquisa e o desenvolvimento científico e tecnológico. Somente assim, poderemos avançar no projeto de uma sociedade antirracista, anti-heteronormativ ista, antissexista, anti-elitista, e anti-adultocê ntrica rumo a justiça social.
É imprescindível investir e estabelecer redes de articulação e fortalecimento internacional da ABPN com instituições de ensino e pesquisa formais e informais na América Latina, Caribe e no continente africano.
Na cultura iorubá, a “cabeça carrega o corpo”! Itan de Ifá (histórias, revelações sagradas do oráculo de Ifá). O Ori (a cabeça) é o centro da espiritualidade e de nossas açoes e vontades. Antes de virmos ao mundo, escolhemos nossa cabeça para trazer par esse mundo e é ela que nos conduz. É o nosso Ori. Que a energia vital de noss@s ancestrais, que nossa mãe protetora, Mama Tchamba[5], nos traga Discernimento, Força, Fé, Senso de Comunidade, Ética, Verdade, Felicidade, Abundancia e Amor em nosso dia-a-dia para estarmos firmes em nosso propósito e alcançar o sucesso que sonhamos. Que a nossa energia vital só tenda a aumentar cada vez mais Ngunzo!
“O espírito da revolta não é
possível senão nos grupos em
que uma igualdade teórica
encobre grandes desigualdades de fato”
(Abdias do Nascimento, 1982)
[1] Agradeço a Professora Eliane Cavalleiro pela convite e oportunidade de socializar essas reflexões sobre a articulação internacional da ABPN.
[2] Mestre em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP)/Brasil. Doutoranda na área de Currículo e Instrução pela Faculdade de Educação da Universidade do Texas in Austin/USA. Coordenadora da área de relações internacionais da ABPN. Fellow da Fundação Ford. Tem publicado artigos na área de educação, relações raciais e de gênero, literatura e diáspora Africana. Foi consultora da UNESCO, CLADE e Sub-coordenadora de políticas educacionais da Coordenação Geral de Diversidade da SECAD/MEC.
[4] Aqui são somente alguns exemplos/fontes para se conseguir financiamentos. Há inúmeras outras que não estão incluídas aqui por conta do tempo que se exige para se fazer esse levantamento e para traduzir a informação que estava em inglês.
[5] Guardiã das/os africanos e seus descendentes que foram levados á força da África, durante o processo de escravidão. Hunter-Hindrew (2007) informa que a denominação Tchamba não diz respeito somente aos grupos fulani e ewe da região norte do Togo. “Tchamba como um sistema universal e divino de compensação humana e preservação étnica das almas africanas que foram inapropriadamente deslocadas de seu destino prescrito [origem territorial] ; engloba todos grupos africanos que foram vendidos durante a escravidão”(p. 538). Hunter-Hindrew: Mami wata: Africa’s ancient God/Godess unveiled. Mami Wata Healers Society of North America Inc., Vol. I, 2007.
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