quarta-feira, 23 de junho de 2010

180 anos do ABOLICIONISTA Luiz Gama

180 ANOS DO NASCIMENTO DE LUIZ GAMA – O PRECURSOR DO ABOLICIONISMO NO BRASIL

Em 21 de junho de 1830 nascia o grande líder abolicionista Luiz Gama. Apesar da importante contribuição que deu à causa da libertação dos escravos, o que faria dele um dos principais heróis do povo brasileiro, seu nome e feitos continuam praticamente desconhecidos. (leiam ao final desse artigo a carta-biográfica escrita por Luiz Gama em 1880)

Por Augusto Buonicore

Filho de Luiza Mahin, uma africana nagô que era líder do seu povo, e de um fidalgo português. Nasceu livre, mas foi vendido como escravo pelo próprio pai quando tinha apenas 10 anos de idade. Fugiu do cativeiro e ganhou o mundo. Mesmo sem ter diploma universitário, se destacou como grande defensor da causa da liberdade. Sua ação abnegada nos tribunais garantiu a libertação de mais de quinhentos escravos.

Utilizava-se das brechas existentes nas próprias leis escravistas, que não eram respeitadas pelos fazendeiros. A principal delas era a de 1831, pela qual foram declarados livres todos os escravos que ingressassem no país após aquela data.

Na verdade, esta havia sido uma lei “para inglês ver” e jamais foi aplicada pelas autoridades brasileiras. No entanto, como não foi revogada, continuava em vigor. Gama conseguiu provar que muitos dos negros escravizados deveriam, legalmente, ser considerados homens e mulheres livres. Calcula-se que existiam cerca de 500 mil pessoas nessa infame situação.

Se tais ações fossem vitoriosas e se generalizassem poderiam representar um golpe de morte ao sistema escravista brasileiro. O próprio Ministério da Justiça imperial passou a pressionar os juizes para que não concedessem o pleito dos advogados abolicionistas. Luiz Gama escreveu: “Sou detestado pelos figurões da terra, que já me puseram a vida em risco; mas sou estimado em muito pela plebe. Quando fui ameaçado pelos grandes, que hoje encaram-me com respeito, e admiram minha tenacidade, tive a casa rondada e guardada pela gentalha”.

Ele era um político radical e estaria à frente daqueles que fundariam o Partido Republicano. Mas, rapidamente, se desentendeu com a maioria conservadora da nova organização. A principal divergência deu-se, justamente, em torno das propostas de abolição dos escravos. Os republicanos ligados aos grandes fazendeiros pregavam uma abolição gradual, com clausulas de permanência do trabalhador no município e indenização aos proprietários. Gama, pelo contrário, defendia a libertação imediata, sem condições e sem indenização. Escreveu ele: “Aos positivistas da macia escravidão, eu anteponho o das revoluções da liberdade; quero ser louco como John Brown, como Espártacus, como Lincoln, como Jesus; detesto, porém, a calma farisaica de Pilatos”.

Certa vez, quatro escravos mataram um fazendeiro e se entregaram à polícia. Logo em seguida, foram linchados por “populares” incitados por escravocratas, com a complacência das autoridades locais. Luís Gama, indignado com a chacina, afirmou: “Eu, que invejo, com profundo sentimento, esses quatro apóstolos do dever, morreria de nojo, de vergonha, se tivesse a desgraça de achar-me entre essa horda inqualificável de assassinos (...) Miseráveis: ignoram que mais glorioso é morrer livre, em uma forca, ou dilacerado pelos cães na praça pública, do que banquetear-se como os Neros na escravidão”. Esta foi mais uma prova do seu profundo compromisso com a causa dos escravos. Vários abolicionistas menos radicais, como Joaquim Nabuco, se chocavam com afirmações belicosas como essas.

Suas posições em defesa da abolição imediata, sem indenização, e da república trouxeram-lhe grandes infortúnios pessoais. Ele e sua família viviam à beira da miséria. As dificuldades, no entanto, não abalaram seus ideais nem o levaram a fazer concessões de princípios. Numa carta dirigida ao filho afirmou, com certa ponta de orgulho: “não se aterrorize com a extrema pobreza que lhe lego, porque a miséria é o mais brilhante apanágio da virtude”. (Veja a carta ao final do texto)

No dia 24 de agosto de 1882 morreu Luís Gama. São Paulo parou. Milhares de pessoas seguiram silenciosamente seu cortejo pelas ruas da cidade. Um jornal afirmou: “jamais esta capital (...) viu mais imponente e espontânea manifestação de dor para por um cidadão”. E continuou descrevendo a cena: “No meio do caminho, grande número de pretos, que tomavam parte no acompanhamento, não consentiu que ninguém mais conduzisse o corpo. E eles revezando-se entre si, conduziram-no pelo resto do caminho”. E pelas mãos dos negros paulistas seu corpo desceu ao túmulo.

Sob inspiração das idéias de Luis Gama, na segunda metade da década de 1880, formou-se uma ampla frente abolicionista — envolvendo escravos, a pequena-burguesia urbana, a jovem burguesia industrial, o proletariado e setores da burocracia de Estado. Um dos catalizadores desse movimento emancipador foi a ação dos próprios homens e mulheres escravizados. Naquele período houve um aumento astronômico no número de rebeliões e de fugas. Estima-se que 1/3 dos 173 mil escravos tenha se evadido das fazendas paulistas apenas nos dois últimos anos que antecederam a abolição.

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