Por: Reportagem: Cláudia Alexandre, da Assessoria de Imprensa do Museu Afro-Brasil - 3/6/2010
S. Paulo - Em tempos de Copa do Mundo, o Museu Afro-Brasil celebra a presença negra no futebol brasileiro com a exposição "De Friendereich a Edson Arantes do Nascimento", que reune fotografias, esculturas, publicações e filmes. A exposição será aberta no dia 20 de junho. Leia mais
S. Paulo - Para destacar a presença dos jogadores negros na história do futebol brasileiro e homenagear aqueles que verdadeiramente fizeram deste esporte uma paixão nacional, o Museu Afro Brasil – Organização Social de Cultura - e a Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo inauguram no dia 20 de junho, domingo, às 12 horas, a exposição “De Arthur Friedenreich a Edson Arantes do Nascimento. O negro no futebol brasileiro”.
A exposição contará com reproduções fotográficas, esculturas, objetos, peças promocionais, caricaturas, textos, publicações e filmes biográficos que incluem personalidades desde Arthur Friedenreich, futebolista negro que brilhou nas décadas de 20 e 30, passando pelos craques Domingos da Guia, Leônidas da Silva, Castilho, Didi, Djalma Santos, Jairzinho, Garrincha e o “rei” Pelé, entre outros .
A mostra é também uma homenagem ao futebol brasileiro, no ensejo da Copa do Mundo da África do Sul, historicamente a primeira realizada em território africano. A curadoria é de Emanoel Araujo, Diretor-Curador do Museu Afro Brasil.
Exposição
A exposição toma como base uma extensa documentação pesquisada em órgãos da imprensa brasileira a partir de 1920 até a Copa do Tri Campeonato Brasileiro em 1970, apresentando textos publicados sobre o assunto como “O negro no Futebol Brasileiro”, de Mário Filho; “Negro, Macumba e Futebol”, do antropólogo alemão Anatol Rosenfeld; as crônicas de futebol “Á Sombra das chuteiras imortais” e “A Pátria em Chuteiras”, de Nelson Rodrigues; “A história do Futebol em São Paulo”, de 1918; biografias dos atletas contemplados na exposição; caricaturas do artista Miécio Caffé, publicadas no jornal A Gazeta Esportiva; do caricaturista Lan; trechos de filmes de Carlos Niemeyer e do cinegrafista Primo Carbonari; filmes biográficos de Mané Garrincha e Pelé; além de poesias de vários poetas brasileiros e músicas relativas ao tema.
Pelé
Edson Arantes do Nascimento, o Rei Pelé, foi cantado em verso, prosa e virou sinônimo do Brasil, por seus feitos nos campos e com a bola nos pés. Na exposição ele pode ser visto em obras que destacaram seu brilhantismo, como nas duas esculturas de Humberto Cozzo, na tela de Aldemir Martins (1973) e na fotografia de Madalena Schwatz (Retrato de Pelé,1982), entre outras.
Vale a pena ver de perto a medalha de prata do Ano Comemorativo da Despedida (1974) e as peças, brinquedos e miniaturas inspiradas na figura do “rei”. Outra curiosidade é a coleção de caixas de fósforos lançadas na década de 50, com fotos dos Campões de 58, a primeira Copa do Mundo vencida pelo Brasil.
De Arthur Friedenreich a Edson Arantes do Nascimento
Não foi fácil, no começo, a aceitação do esportista negro no Brasil. Em alguns clubes no Rio de Janeiro e São Paulo essa presença era terminantemente proibida, quanto mais da elite era o clube. É sabido que o Fluminense Futebol Clube, tradicional Clube das Laranjeiras do Rio de Janeiro, o negro não entrava em seus quadros sociais e muito menos na sua equipe de futebol. Assim também era em São Paulo, com o Esporte Clube São Paulo.
A questão da ambigüidade vive lado a lado em todos os momentos da vida nacional. Veja esse exemplo: “Ninguém do Fluminense, pensava em termos de cor, de raça. Se Joaquim Prado,winger-left do Paulistano, quer dizer, extrema esquerda, recebido de braços abertos no Fluminense. Joaquim era preto, mas era de família ilustre, rico, vivia nas melhores rodas.”
O futebol seria mesmo cultura brasileira? Seria uma porta de entrada à cultura brasileira? Poderia ser uma porta para ascensão um social do esportista negro? O homem Negro Brasileiro com suas raízes ancestrais africanas teria no corpo e na alma um especial talento instintivo para esse esporte?
Para responder essas e outras questões da inclusão do homem negro no mundo do futebol a exposição “De Arthur Friedenreich a Edson Arantes do Nascimento. O negro no futebol brasileiro” apresentará o que foi escrito por alguns pensadores, críticos e comentaristas esportivos, suas opiniões, além das imagens que recuperam a trajetória de desportistas negros na história do futebol brasileiro.
Contribuição negra
O certo é que a grande contribuição dos afrodescendentes ao esporte nacional ficou e fica cada vez mais patente, não só no futebol nacional, mais em muitas seleções européias, com presença constante, principalmente nos países chamados de colonizadores do extenso território africano.
O futebol, que nascera do estrato de uma elite social rica e de origem européia, cada vez mais se tornava brasileiro, incorporando nos seus quadros atletas afrodescendentes. Torcedores do povo faziam desse esporte mais nacional, mais brasileiro, as torcidas cresciam e viam nesses astros da bola narcisamente um espelho de sucesso, a popularidade desses se transformava em mania nacional, uma doença mesmo.
Intelectuais, políticos, poetas, escritores, músicos, pintores e cartunistas expressavam suas paixões pela magia da bola que corria nos pés desses desafiadores da gravidade, desses dançarinos soltos no ar, desses requebrados mirabolantes. Príncipes, reis, reis da bola, como o rei Pelé, descrito assim pela verve de Nelson Rodrigues: “Dir-se-ia um rei, não sei se Lear, se imperador, Jones, se etíope. Racialmente perfeito, do seu peito parecem pender mantos invisíveis. Em suma: ponham-no em qualquer rancho e sua majestade dinástica há de ofuscar toda corte em redor”.
A exposição “De Arthur Friedenreich a Edson Arantes do Nascimento. O negro no futebol brasileiro” dedicará a esses atletas que magnificamente atuaram em seus clubes ou que representaram o Brasil nos campeonatos internacionais de clubes ou da seleção brasileira de futebol como geniais mágicos da bola. Significa uma homenagem à memória de antigos esportistas que inscreveram seus nomes na história desse esporte que, de tão popular, mexe e remexe com a alma de milhões de brasileiros de todas as cores, de todos os credos e de todas as raças.
Copas
A primeira Copa do Mundo foi em 1930, e só 28 anos depois o Brasil se tornou campeão mundial, em 1958. E essa fibra se deveu aos titulares e reservas Gilmar, Castilho, Djalma Santos, De Sordi, Bellini, Mauro, Orlando, Zózimo, Nilton Santos, Oreco, Zito, Dino, Didi, Moacir, Garrinha, Joel, Mazolla, Vavá, Pelé, Dida, Zagalo e Pepe. Na Copa do Mundo de 1962 ficou consignada a superioridade do futebol brasileiro, e os bicampeões mundiais foram Gilmar, Castilho, Djalma Santos, Jair Marinho, Mauro, Bellini, Zózimo, Jurandir, Nilton Santos, Altair, Zito, Zequinha, Didi, Mengálvio, Garrinha, Jair da Costa, Vavá, Coutinho, Pelé, Amarildo, Zagalo e Pepe.
O Brasil se tornou tricampeão de futebol em 1970, no México, com uma seleção dos sonhos que ainda continua viva em nossa memória pela maravilha de espetáculos dados pelos nossos jogadores, e, assim, quem não se lembrará dos gols de Jairzinho, Pelé e Tostão, dos canhões de Rivelino, dos sensacionais passes de Gerson e das declarações emocionadas do maior de todos os jogadores, o senhor Edison Arantes do Nascimento que, assim, com essa vitória, dava por cumprida sua contribuição ao selecionado brasileiro e ao futebol do Brasil?
Houve um tempo, não muito distante, em que os jogadores de futebol eram verdadeiros artistas da bola, eram magníficos astros, e então eles ganhavam belos codinomes dados pela imprensa ou pelos críticos esportivos.
Para Arthur Friedenreich, o mulato de olhos verdes, foi o El Tigre ou, como lhe chamava seu pai, o “Pezinho de Ouro”. Era um marcador implacável, feroz, dizem que em vida marcou mais de 1.200 gols, lá pelos idos dos anos 20 e 30.
Em 1919 marcou o gol da vitória contra o Uruguai, virou herói nacional, abriu, assim, o espaço para o homem negro no futebol brasileiro, antes branco e elitista. Ele era filho de um comerciante alemão e de uma lavadeira negra brasileira, nasceu no bairro da Luz em São Paulo, em 18 de julho de 1892 e morreu, em 1969, aos 77 anos.
A invenção da bicicleta
Depois dele, vieram tantos e tantos outros. Astros como Domingos da Guia e Leônidas da Silva, o chamado “Diamante Negro”, o inventor da bicicleta, que era aclamado pela imprensa, nas páginas das revistas, nos comerciais.
Este último foi, dizem, um dançarino no campo, seu corpo tinha a elasticidade de um capoeirista. O mencionado Nelson Rodrigues não raro se referia a Didi, em suas crônicas esportivas, “com o seu magnífico tipo racial de príncipe etíope de rancho”, aquele que também tinha criado a famosa jogada intitulada “folha seca”. Garrincha, esse era a paixão nacional, o maior ponta-direita do mundo, cantado em prosa e em versos, como estes de Vinícius de Morais:
O anjo de pernas tortas
A um passe de Didi, Garrincha avança
Colado o couro aos pés, o olhar atento
Dribla um, dribla dois, depois descansa
Como a medir o lance do momento.
Vem-lhe o pressentimento; ele se lança
Mais rápido que o próprio pensamento,
Dribla mais um, mais dois; a bola trança
Feliz, entre seus pés – um pé de vento!
Nuns o transporte, a multidão contrita.
Em ato de morte se levanta e grita
Seu uníssono canto de esperança.
Garrincha, o anjo, escuta e atende: Gooooool!
É pura imagem: Um G que chuta um O.
“Assim, além do grande mito do futebol de São Paulo dos anos 1920, Arthur Friedenreich, por certo, muitos desses fenomenais atletas continuam na nossa memória por suas conquistas, sobretudo nas três grandes conquistas brasileiras de 1958, 1962 e 1970. Eles afastaram a sombria depressão provocada pela Copa de 1950. Djalma Santos, o sisudo e sóbrio, e Nilton Santos, o atrevido, ambos bicampeões do mundo. Quem não homenagearia Gerson, o canhotinha de ouro, Rivelino com seus chutes de canhão, o elástico Gilmar e a grande e bela figura do capitão Bellini?
Ademir da Guia, filho do genial Domingos da Guia, e, por fim, Zizinho e sua alegre presença de malabarista, moleque impondo seu compasso como se fosse um sambista. E assim, em seu A pátria em chuteiras, no artigo “O escrete do sonho”, lemos de Nelson Rodrigues: “Pelé maravilhosamente negro, poderia erguer o gesto, gritando: ‘– Deus deu-me sangue de Otelo para ter ciúmes da minha pátria’. E assim brancos e pretos somos 90 milhões de Otelos incendiados de ciúme pela pátria, Emanoel Araujo.
Serviço:
Diretor curador: Emanoel Araujo
Diretor executivo: Luiz Henrique Marcon Neves
Endereço: Av. Pedro Álvares Cabral, s/ nº Parque Ibirapuera- Portão 10 São Paulo- SP - Brasil
CEP: 040094-050
Fone: 55 11 5579 0593 begin_of_the_skype_highlighting 55 11 5579 0593 end_of_the_skype_highlighting
www.museuafrobrasil.com.br
Funcionamento: de terça a domingo, das 10 às 17 horas (permanência até às 18h)
Estacionamento: Portão 3 – Zona Azul
Entrada: Grátis
Para agendar visitas: agendamento@museuafrobrasil.com.br
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