Esquema do experimento demonstrando o efeito borboleta agindo no cérebro. Um único eletrodo foi usado para induzir uma sinapse em um neurônio individual, que se espalhou por milhões de outros.[Imagem: UCL] |
Cérebro não-confiável
Da próxima vez que sua memória lhe pregar uma peça, você já tem uma desculpa: de acordo com uma pesquisa feita por cientistas britânicos, e publicada no último exemplar da revista Nature, o cérebro é intrinsecamente não-confiável.
Isto pode não ser muito surpreendente para a maioria de nós, sempre às voltas com esquecimentos e erros de raciocínio, mas o fato tem confundido os neurocientistas há décadas.
O problema parece começar no fato de que os cientistas comparam o cérebro com um computador.
E, assim sendo, o cérebro seria também o dispositivo de computação mais poderoso que se conhece, como poderia ele funcionar tão bem se o comportamento dos seus circuitos é variável?
Efeito borboleta no cérebro
Uma hipótese levantada há muito tempo é que os circuitos do cérebro são de fato confiáveis, e a variabilidade aparentemente alta se deve a que o cérebro está envolvido em muitas tarefas simultaneamente, uma afetando as outras.
É esta hipótese que os cientistas da Universidade College London agora testaram diretamente.
A equipe se inspirou no chamado efeito borboleta - que estabelece que o bater das asas de uma borboleta no Brasil pode gerar um tornado no Texas, devido a uma longa cadeia de causalidades que se espalha sem controle a partir de um evento inicial.
Efeito multiplicador
O experimento consistiu em introduzir uma pequena perturbação no cérebro, o equivalente neural do bater de asas de uma borboleta, e acompanhar o que aconteceria com a atividade nos demais circuitos cerebrais.
Os resultados mostraram que o pequeno evento inicial gera um gigantesco efeito multiplicador.
A perturbação inicial consistiu de um único impulso nervoso - um disparo de neurônio - induzido no cérebro de um rato.
Esse único disparo extra causou cerca de trinta novas sinapses nos neurônios próximos, a maioria dos quais geraram outros trinta disparos extras, e assim por diante.
Isso pode não parecer muito, dado que o cérebro produz milhões de sinapses a cada segundo, mas os pesquisadores estimaram que o impulso extra induzido artificialmente afetou uma quantidade de neurônios no cérebro que também atinge a casa dos milhões.
Ruído no cérebro
"Este resultado indica que a variabilidade que vemos no cérebro pode ser na realidade devido ao ruído, e representa uma característica fundamental da função cerebral normal," afirma o Dr. Mickey Londres, coautor do artigo.
Esta rápida amplificação de disparos neuronais significa que o cérebro gera muito mais ruído do que os computadores.
No entanto, o cérebro pode realizar tarefas muito complexas com enorme velocidade e precisão - com muito mais rapidez e precisão do que o computador mais poderoso já construído, e provavelmente a ser construído em um futuro imaginável.
Os pesquisadores sugerem que, para que o cérebro funcione tão bem frente a níveis tão elevados de ruído, ele deve estar usando uma estratégia chamada de código de frequência (rate code).
Em um código de frequência, os neurônios consideram a atividade de um conjunto de muitos neurônios, ignorando a variabilidade individual, ou ruído, produzido por cada um deles.
Fiação cerebral
Se a hipótese estiver correta - e o cérebro produzir mesmo muito ruído - restaria saber o porquê.
Os pesquisadores sugerem que uma possibilidade é que este seja o preço que o cérebro paga pela alta conectividade entre os neurônios - cada neurônio conecta-se a cerca de 10 mil outros, resultando em mais de 8.000 mil quilômetros de "fiação" no cérebro humano.
Os cientistas consideram que a alta conectividade é pelo menos em parte responsável pela capacidade computacional do cérebro.
No entanto, como mostra a pesquisa, quanto maior a conectividade, mais ruidoso será o cérebro. Portanto, embora o ruído não seja um recurso útil, ele seria, pelo menos, um subproduto de um recurso útil.
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