A Conferência Internacional sobre Assédio Moral e outras manifestações de violência no trabalho: Ética e Dignidade dos trabalhadores, foi realizada no Rio de Janeiro, entre os dias 12 e 15 de julho. O evento é organizado pelo Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (Iesc) e teve participação do CEERT em duas das mesas propostas na programação.
A diretora executiva do CEERT, Cida Bento, esteve presente na mesa que tratou do tema “A Transversalidade do Gênero e Raça/Etnia no Assédio Moral”, que aconteceu na tarde do dia 12. Segundo ela, o debate sobre assédio moral nas relações de trabalho é uma importante conquista do ponto de vista também das relações de raça e de gênero. “Na área de racismo, há um ganho muito grande de ações contra o assédio moral, ou sexual. Antes alguns tipos de humilhação como chamar o subordinado de ‘preto preguiçoso’ ou de ‘negra suja’, como já tivemos caso em nosso departamento jurídico, eram tidos como normal. Hoje a legislação em vigor nos permite confrontar o opressor dentro das relações de trabalho”, diz. A baixa reflexão que homens – brancos, heterossexuais, e que representam um perfil secularmente dominante na sociedade – têm sobre si próprios enquanto pessoas que perpetuam a desigualdade também foi tema discutido por ela. “Busquei focar mais no assediador, esse cara aparentemente normal, que convive todo dia em sociedade, mas que exerce, pela posição de comando que ocupa no trabalho, um extremo poder sobre as outras pessoas, um assédio moral que prejudica a saúde física e emocional dos que convivem com ele”, afirma. Um exemplo do comportamento que favorece o assédio, explica a diretora Cida, são aquelas pessoas que se omitem ou silenciam frente à violência. “No período do Nazismo na Alemanha, por exemplo, muitas pessoas, poderiam ser ou não militares, se omitiram e desta forma, concordaram com o que Hitler estava fazendo. Não eram loucos como ele, mas silenciaram, deixando que milhões de judeus fossem mortos. E silenciar, nesse caso, é concordar”. Da mesma forma, ela enfoca o silêncio daqueles que teimam em repetir que não existe racismo no Brasil. “Então, a idéia era refletir para que as pessoas pudessem olhar mais para si próprias e ver como elas no dia-a-dia, às vezes de maneira não intencional, perpetuam a desigualdade, comportam-se como assediadores silenciosos no cotidiano”, completa. No Brasil não existe uma legislação específica para assédio moral em âmbito nacional. No entanto, em vários estados e nas principais cidades do país já existem leis que garantem a punição aos agressores. Por assédio moral entendem-se práticas reiteradas e sistemáticas de atitudes que humilham e desqualificam o trabalhador, atacando sua autoestima, fazendo-o perder confiança em sua capacidade de trabalho. Conceituação usada por, Margarida Barreto, da Rede Nacional de Combate ao Assédio Moral no Trabalho, pioneira em pesquisas sobre a área e uma das coordenadoras do evento e parceira há anos, do CEERT. Na área da saúde da população negra existem pesquisas que indicam o assédio moral como prática comum entre médicos. Esse assédio se dá, por exemplo, a partir da constatação de que os médicos ficam bem menos tempo com as mulheres negras em consultas do que com as mulheres brancas e que tocam menos as mulheres negras do que as mulheres brancas (Sobre esse assunto, leia mais aqui). Outro caso exemplar ocorreu em São Paulo no ano de 2004, quando três merendeiras da Escola Estadual Caetano de Campos denunciaram o diretor da instituição por prática de racismo, conforme contou Edna Muniz, consultora na área da saúde do trabalhador no CEERT, que participou da mesa sobre Ações Desenvolvidas ou em Desenvolvimento: Dificuldades e Conquistas, durante a Conferência Internacional de Assédio Moral. O diretor da escola à época costumava chamar a cozinha de “senzala” e não se constrangia ao chamar as funcionárias de “negras sujas”. Contra o diretor foi aberto um processo-crime e contra o Estado, processo de responsabilização. O diretor foi afastado do cargo e a Secretaria da Educação de São Paulo deu início a novas práticas dentro da escola, inclusive, com a contratação de professores e funcionários negros. O CEERT atuou juridicamente no caso, tendo em vista que se tratava de um caso emblemático que serviria de exemplo para outras práticas de racismo e assédio moral ocorridas pelo Brasil. Além disso, conta Edna, o CEERT também atuou com atendimento psicológico, a partir da metodologia de Grupo Consenso. “Para nós esse foi um caso que comprovou a relevância de um trabalho de escuta. Do ponto de vista da saúde do trabalhador, essas mulheres tinham indicativo de doenças como depressão e pressão alta, mas as patologias não eram associadas à violência que elas vinham sofrendo durante mais de dois anos no ambiente de trabalho”, diz. Casos como o contado por Edna indicam a importância do debate sobre o racismo atrelado também ao assédio moral sofrido nas relações de trabalho, uma vez que tal violência tem impacto significativo no estado psicológico das pessoas. “São as mulheres negras que em geral ocupam os piores lugares no mercado de trabalho, baixos salários, sem registro, altas jornadas, que sofrem exatamente esse tipo de pressão e que passam por humilhações no cotidiano de trabalho”, completa. A Conferência Internacional sobre Assédio Moral e outras manifestações de violência no trabalho: Ética e Dignidade dos trabalhadores foi realizada no Centro Cultural Horácio Macedo, no Centro de Ciências da Matemática e da Natureza (CCMN), no campus da UFRJ – Ilha do Fundão
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